quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

O Sonho de uma nação
por Rildo Ferreira


O papel que o Estado desempenha para promoção do bem-estar social, com desenvolvimento sustentável e equilíbrio ecológico, deve estar alicerçado na educação. Qual povo não deseja tornar-se efetivamente grande enquanto nação onde desigualdade não seja motivo de vergonha e a justiça seja implacável contra os que manipulam as regras sociais para sobrepujar-se aos menos favorecidos? Qual povo não deseja caminhar com as pernas próprias garantindo que todos os seus filhos e filhas tenham oportunidades iguais? Qual foi a nação que conseguiu promover tais princípios sem educação, sem democracia e sem respeito à dignidade humana?

Ora, o que a democracia e a dignidade humana têm que ver com educação? Para o educador brasileiro Paulo Freire (1921-1997), que teve forte influência educacional nos anos de 1970 em vários países africanos, não se faz educação sem democracia e respeitar a dignidadade humana significa respeitar as visões de mundo que as pessoas possuem, respeitar a autonomia do ser do educando, e isso exige, segundo ele, “bom senso”. Para Freire (1996), o processo educativo perpassa as questões da sala de aula levando-nos a acreditar que só é possível educar plenamente quando o ambiente é favorável, esteticamente agradável, e onde as pessoas não se sintam privadas do direito de se manifestar.

Durante muitos anos o Brasil ensinou história segundo a visão lusitana, onde os heróis eram lusitanos. Redescobriu uma forma crítica de estudar a história brasileira e passou a ver os ‘heróis lusitanos’ como bárbaros violentos e opressores, redescobrindo novos heróis, como o negro Zumbi dos Palmares, nascido no Estado de Alagoas em 1655 e morto degolado por traição em 1695, ícone da resistência e luta pela libertação dos escravos no final do século XVII. Esse redescobrimento histórico nos fez envergonhados de fazer escravos homens e mulheres que, assim como nós tinham todos os direitos de viverem em liberdade, de gozarem de justiça e da solidariedade humanas. Como isso foi possível? Ora, nos tempos duros, onde a democracia era dissinulada, oprimida de fato, não nos permitiam ver esta outra verdade e perpetuávamos a ‘verdade segundo a tradição lusitana européia’, onde negros deveriam ser escravos, os pobres deveriam viver marginalizados e não-alfabetizados e onde só os ricos gozavam de cidadania plena. Com a democracia os historiadores puderam reescrever a história e, aos poucos, descobrimos que somos nossa própria esperança, que poderíamos construir a nossa própria cultura, um jeito brasileiro de ser mais humano, mais solidário.

E a educação tem um papel relevante na formação de uma nação que se propõe ao desenvolvimento e a universalização. Vejam, falo de universalização e não de globalização. Globalização ao meu modo de ver é tornar tudo igual segundo a cultura global hegemônica. E que cultura é esta, cara pálida? A que os europeus e norte-americanos tentam nos impor? Se eles que já estão secularmente adaptados à essa cultura vivem dilemas contundentes, qual lugar eles reservam para nós no processo de globalização? Eis que eu falei universalização. Isso no meu modo de ver é permitir uma interação com outros países do mundo, inclusive os norte-americanos e europeus, assim como os asiáticos, africanos e sul-americanos, sem, contudo, abrir mão de nossa cultura e de nossa independência. Não podem apagar nossa visão de mundo, nossa história e nossa cultura. Universalizar é interagir universalmente respeitando as diferenças existentes, sem, contudo, querer impor uma cultura sobre outra.

A educação permite acesso à modernização universal. Um povo que não é educado não consegue universalizar-se e estará sujeito à marginalização. Waldez Luiz Ludwing, em palestra realizada no Rio de Janeiro em 1999, aborda a questão do fim de algumas profissões e o surgimento de outras. Das que desaparecem deixam muitos desempregados e, segundo ele, continuarão sem emprego se não buscarem qualificação para os novos empregos disponíveis no mercado. As novas profissões, e algumas antigas que se modernizaram, exigem que os novos profissionais sejam educados e exigem que essa educação seja continuada. Pessoas incapazes e pouco produtivas são aquelas que se mantém fazendo uma só coisa e o tempo todo. Quando não há o que fazer sobre aquilo em que ele é especialista, logo fica ocioso, sem produzir. Esse tipo de profissional o mercado moderno está dispensando. E é sobre isso que Ludwing busca alertar. O trabalhador que quer ter trabalho precisa envolver-se com o aprendizado das novas tecnologias, conhece-las e domina-las quando for o caso. Não há mais espaço para o adestrado. Para o novo mercado, Ludwing diz que o indivíduo precisa ser educado. Nessa mesma linha de raciocínio precisamos alertar que uma nação que se propõe ao desenvolvimento sustentável precisa estar comungando com esse pensamento e garantindo ao povo uma educação substantiva, pujante, oportunizando a todos e a todas acesso a toda forma de conhecimento, de saber.

Hélio Lima, no jornal.st, diz claramente que o indivíduo deve buscar algumas respostas antes de investir na sua carreira. Faço coro acrescentando o questionamento: o que as pessoas elogiam em você? No que é que você sabe fazer melhor que os outros? Respondendo a estas perguntas, os moços e moças devem buscar investir em si mesmos. Eis que surge o principal questionamento então: Como investir na minha carreira dentro do meu país? Quais oportunidades eu as tenho aqui? E se não as tenho, onde encontra-las? Ora, senhoras e senhores, cabe ao governo fazer o apontamento destas respostas pretendidas. Ludwing em sua palestra disse que se muitas pessoas estão a fazer uma determinada coisa, cabe ao revolucionário buscar fazer algo novo, diferente, algo que vai produzir um impacto positivo na vida das pessoas. Saber o que quer os jovens sabem. Eles desejam sucesso pessoal e profissional. Quais são as chances de sucesso do futuro de uma nação onde a educação passa ao largo? Educação é fundamental para a formação do cidadão e da cidadã. E faz-se necessário que seja uma educação plena, democrática, universal, integral e para todos e todas. Sem este princípio, em que deve pautar-se o sonho de uma nação?

Freire, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Rio de Janeiro. DP&A, 1996.

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