domingo, 23 de março de 2008

Brincando e aprendendo com Matemática
Por Rildo Ferreira


INTRODUÇÃO

Este trabalho tem por finalidade apresentar uma proposta de atividade lúdica com vistas à introdução do aprendizado da Fração e da Geometria no ensino da matemática para a 5a. série do ensino fundamental (6o. ano). Ele está restrito a estas duas temáticas considerando uma dificuldade em se promover uma atividade única com o propósito de contemplar todos os temas previstos para a série, mas também pode ser utilizado para explicar sobre números decimais, unidades de medida e conjuntos, como demonstraremos adiante.

A idéia é estabelecer uma conexão entre os temas propostos e a concreticidade na vida de cada um, fazendo o educando perceber que frações e geometria estão presentes nos objetos, na economia, no trabalho, no lazer etc., e desse modo, diminuir a rejeição precoce daquele que é levado ao ensino da matemática e proporcionar, para quem ensina, uma atividade que perpassa o espaço restrito da sala de aula e da lousa para um espaço que permita um aprender-fazendo.

Este é o desafio. Esta é a proposta que se segue.


A ATIVIDADE

O que se propõe é uma competição entre grupos de alunos de uma mesma classe. O que está em disputa pode ser tratado de duas maneiras distintas: a primeira se restringe à classe e pode ser definido como uma pontuação para um trabalho de grupo; a segunda requer um entendimento interdisciplinar, ou seja, os pontos adquiridos na competição o aluno/a poderá utiliza-los em qualquer disciplina que desejar.

Os grupos serão levados a um espaço aberto onde seja possível fazer medição de até 50 metros. Neste espaço devem ser feitas duas retas paralelas distanciadas por 5 metros uma da outra. No fazer das retas é preciso que cada aluno/a possa adquirir a compreensão de que retas são pontos contínuos e lineares. O objetivo desta separação entre as retas por uma distância de 5 metros é levar cada grupo a estabelecer uma possibilidade de se fazer uma medição sem os instrumentos adequados como metro, fita-métrica ou trena. Então, cada grupo conta, em passos, esta distância.

Quando os grupos concluírem suas medições e estabelecerem seus parâmetros de medida, serão levados a uma disputa para saber quais dos grupos, partindo de um ponto A, estabeleça um ponto B, a uma distância de 30 metros (ou outra medida). O grupo que acertar a medida exata fica com 2 pontos. Em não havendo um acerto exato, o grupo que mais próximo ficou do objetivo, que é o de alcançar os 30 metros, ganha 1 ponto.

O propósito desta atividade é alcançar os conceitos de fração e de geometria, podendo se estender também, aos conceitos de unidades de medida e de conjunto, de maneira bastante dinâmica e interativa, considerando que os alunos e alunas dos grupos estabelecerão conjuntamente os critérios para alcançarem os objetivos permeando entre eles raciocínio e criatividade.

A FASE PREPARATÓRIA


  • A educação para a cidadania, que é um dos grandes objetivos da educação de hoje, exige uma ‘apreciação’ do conhecimento moderno, impregnado de ciência e de tecnologia. Assim, o papel do professor de matemática é particularmente importante para ajudar o aluno nessa apreciação, assim como destacar alguns dos importantes princípios éticos a ela associados ((grifo meu) D’Ambrósio, 1996).

A fase preparatória começa exatamente de onde se quer sair, ou seja, na sala de aula. O professor de matemática deve explicar os objetivos que se pretende alcançar colocando os temas na pauta da aula. Feitas explicações necessárias, a classe será dividida em grupos de y elementos, obrigando que cada grupo tenha meninos e meninas para um justo equilíbrio. Um aprendizado neste ato é o de conviver com o diferente, o da aceitação do oposto no grupo e, também, do equilíbrio entre grupos (relações de forças entre classes). Isto pode não ter significado matemático, mas tem uma importância significativa para a cidadania, a qual deve ser uma das finalidades da educação, sobretudo do ensino da matemática (D’Ambrósio, 1996). Ora, Nesta fase já é possível levar o aluno/a compreender a noção de conjunto e de fração. Ou seja, os alunos e alunas da classe juntos formam um conjunto de x elementos. Ao separar em grupos estamos fracionando a classe criando subconjuntos. Este desenrolar pode ser representado pelo esquema abaixo:





Outras experimentações durante a competição podem levar os alunos/as a compreenderem a idéia de interseção ou de união, como o exemplo de interseção que passo a expor: entre dois grupos em competição, é selecionado um elemento de cada grupo para fazer o embate (fazendo a medição do espaço proposto). Esses dois elementos formam um novo conjunto e será chamado conjunto C interseção de AB. Veja o esquema abaixo.


A COMPETIÇÃO

Com a divisão dos grupos já concretizados, serão levados à um espaço aberto onde seja possível fazer medição de até 50 metros. Neste espaço devem ser feitas duas retas paralelas distanciadas por 5 metros uma da outra. No fazer das retas é preciso que cada aluno/a possa adquirir a compreensão de que retas são pontos contínuos e lineares e de que entre dois pontos, só é possível uma reta. Esta tarefa deve receber o auxílio de um objeto de medição como metro, trena ou fita-métrica e deve ser feito pelos alunos com o auxílio do professor. O objetivo desta separação entre as retas por uma distância de 5 metros entre elas é levar cada grupo a estabelecer uma possibilidade de se fazer uma medição sem os instrumentos adequados como metro, fita-métrica ou trena. Então, cada grupo conta, em passos, esta distância. No fazer dessas duas retas paralelas, o aluno/a é levado a conhecer a unidade de medida como padrão de comprimento. As retas não precisam ter uma medida padrão, mas ao desenvolve-la o professor deve atentar para dois pontos AB distintos, levando os alunos a compreenderem que entre esses dois pontos só é possível uma reta. Aqui é possível, também, ensinar que este espaço é uma fração de um todo que se deseja conhecer. Ou seja, se para fazer 5 metros o aluno deu 7 passos, esse espaço é uma fração de um espaço a ser estabelecido pelo professor e que deverá ser medido numa proporção equivalente. Assim, se a meta é alcançar 30 metros, por exemplo, o aluno será levado a utilizar-se do estudo das funções. Para 5 metros, 7 passos; para 30 metros, x passos.


Quando os grupos concluírem suas medições e estabelecerem seus parâmetros de medida, serão levados a uma disputa para saber quais dos grupos, partindo de um ponto A, estabeleça um ponto B, a uma distância de 30 metros (ou outra medida). Então os alunos devem ter claro que se tem conhecido o ponto A e se deseja conhecer o ponto B e que este ponto deve ser estabelecido por eles. Logo, partindo do ponto A, e com base no que já foi apreendido na iniciação da competição com as retas paralelas, cada grupo, ao seu modo, é que vai dizer onde é o ponto B. Deve ser levado em consideração que cada grupo parte do ponto A para uma direção distinta, evitando aproveitar-se da conclusão de outro grupo. Com um instrumento de medição o professor, sob a observação dos grupos, vai fazer a medição para saber o grau de acerto de cada grupo. O grupo que acertar a medida exata fica com 2 pontos. Em não havendo um acerto exato, o grupo que mais próximo ficou do objetivo, que é o de alcançar os 30 metros, ganha 1 ponto.

A competição termina quando todos os grupos apresentarem seus resultados. O vencedor (ou vencedores) leva a pontuação pré-estabelecida para o seu histórico disciplinar. É importante deixar a competição em aberto para oportunizar que os outros grupos tenham condições de conquistarem seus pontos. Ao final, e sem deixar esse propósito vazar para os alunos, o professor pode avaliar qual foi o resultado desta atividade para cada aluno aplicando exercícios práticos em sala de aula, permitindo a todos levarem pontos independentes dos resultados obtidos na competição.

CONCLUSÃO

A atividade proposta não tem uma eficácia comprovada cientificamente. Contudo, ela foi levada ao conhecimento de outros acadêmicos e, também, de alguns professores do ensino básico que se comprometeram a pratica-la com seus alunos por considera-la exeqüível e atraente e com sentido sólido para o processo ensino-aprendizagem da matemática na 5a. série do ensino fundamental.

Naturalmente não se trata de uma proposta acabada e verticalizada. Ao contrário, ela se propõe a uma horizontalização inconclusa para um aperfeiçoamento a partir das experimentações práticas no sistema educacional. Por fim, espera-se alcançar a finalidade de produzir conhecimento do ensino da matemática relacionando com a vida prática dos alunos e alunas minimizando a rejeição que a matéria produz nas séries iniciais e que são cultivadas por muito tempo ao longo da vida, senão por toda ela.

Espera-se, também, contribuir para a superação dos preconceitos, para cultivar o respeito às diferenças e para promover a solidariedade entre as pessoas, esperando um mundo mais justo, igual e fraterno entre todos e todas.


......................................................................
Referência Bibliográfica

D’AMBRÓSIO, Ubiratan. Educação Matemática: da teoria à prática. 12ª ed. Campinas/SP.Papirus, 1996. – (Coleção Perspectivas em Educação Matemática).

sexta-feira, 21 de março de 2008

MATEMÁTICA DA VIDA NA ESCOLA
Por Rildo Ferreira dos Santos

-revisado-
Este artigo se propõe a dialogar sobre o ensino da matemática aplicado na escola e as mais variadas formas do uso da matemática no cotidiano das pessoas Pretende, também, questionar o propósito conservador do ensino da disciplina que se mantém distante da concreticidade na vida dos educandos, tornando-se uma matéria precocemente rejeitada de tal modo que, ao fim e ao cabo, pouca contribuição oferece para a resolução dos problemas emergentes na sociedade capitalista moderna.

A partir do momento em que a nova tecnologia estabeleceu novos padrões de vida e de consumo a matemática passou a ser um instrumento constante na vida das pessoas que a usa de maneira inconsciente, mas com muita eficiência. Assim é possível ver um feirante que não foi sequer alfabetizado a negociar seus produtos com os fregueses. Ora, se o feirante erra em benefício do freguês tem um prejuízo financeiro; se o erro é em próprio benefício, perde o freguês (Carraher e outros, 1995. Pg. 46), logo, é preciso um acerto no trato do negócio feirante/consumidor. O feirante sabe estabelecer o preço do produto que vende para ter lucro. Sabe, também, receber pelo produto e dar o troco corretamente, sem prejuízo de si mesmo ou do cliente.

Esta matemática aplicada na vida do feirante é igualmente exercida por seus filhos que os substituem no negócio a partir da meninice ainda. A forma que adotam para a resolubilidade de seus problemas é diferente da forma do ensino da matemática nas escolas. Um exemplo clássico é o do feirante que vende mandioca (ou aipim) a R$ 1,80 (um real e oitenta centavos) por quilo. Quando um cliente deseja quatro quilos da mandioca, ele calcula o valor total utilizando um agrupamento natural, ou seja, ele soma 2 quilos primeiro: R$ 1,80 + R$ 1,80, são R$ R$ 3,60. R$ 3,60 + R$ 3,60 são, 3 + 3 são 6, 0,60 + 0,60 é 1,20; 6 + 1,20 são R$ 7,20 (Idem, 1995). Eis que o resultado do cálculo está certo, entretanto, o feirante utilizou um método diferente daquele que se aprende na escola. Pode-se afirmar que o método utilizado pelo feirante está errado? A escola deve abolir o sistema tradicional para adotar o modelo do feirante?

A resposta para as questões acima é a mesma. Não. O feirante está correto, pois o resultado foi exatamente aquele que teria sido obtido se utilizado os esquemas tradicionais adotados no ensino da matemática e resolveu de modo justo um problema emergido quando o cliente resolveu levar quatro quilos de mandioca de uma só vez. A escola não deve abolir o método tradicional de ensino, mas não pode ignorar todo esse saber que a própria vida proporciona aos alunos. Um fato verídico pode ilustrar o entendimento desse diálogo. Numa aula de matemática o professor tentava fazer os alunos entender o que era uma PA (Progressão Aritmética). Depois de algum tempo explicando o professor perguntou se a turma tinha entendido o assunto. Um aluno disse o seguinte (não exatamente assim, mas o sentido era este): “professor, disso aí eu não entendi nada, mas se eu comprar pão com R$ 10 na padaria, sei exatamente quanto o caixa tem que me devolver de troco (www.pedagogosdofuturo.blogspot.com)” ¹.

Ora, o ensino da Progressão Aritmética é importante, mas o aluno não viu concreticidade no aprender PA. Essa é uma questão fundamental e que as escolas, sobretudo os educadores professores de matemática, precisam estar atentos. Para o aluno, aquilo que lhe é ensinado precisa ter uma relação com sua vida concreta. Somente aquilo que faz sentido para quem é ensinado será verdadeiramente apreendido a ponto de não se perder ao longo das idades. Esse diálogo nos remete ao pensamento de Paulo Freire sobre o respeito aos saberes do educando. Ele afirma que “Por isso mesmo pensar certo coloca ao professor ou, mais amplamente, à escola, o dever de não só respeitar os saberes com que os educandos, sobretudo os das classes populares, chegam a ela saberes socialmente construídos na prática comunitária... (Freire, 1996. Pg 30)”.

Cendales e Mariño (2006) tratando do processo de aprendizagem na pedagogia dialógica dizem que se os educadores querem que a aprendizagem seja viável devem levar em conta a proximidade dos seus objetivos e o educando, ou “De outro modo, estaremos estabelecendo metas inalcançáveis, que certamente o educando até memorizará, mas depois esquecerá para sempre”.

Na pesquisa desenvolvida por Carraher e outros (1995), em que trata da Matemática Escrita versus Matemática Oral, eles concluem apontando para o reconhecimento e a valorização da matemática oral, como a aplicada pelo feirante, como um processo de aprendizagem que não deve ser desprezado pela escola. Embora o parágrafo seja um pouco extenso, sua reprodução na íntegra reforça o eixo fundamental desse diálogo proposto. As pesquisadoras e o pesquisador afirmam que

  • Embora não se pretenda sugerir a substituição da matemática escrita pela matemática oral dentro da escola, uma vez que a matemática escrita apresenta inúmeras vantagens do ponto de vista do desenvolvimento do aluno a longo prazo, é importante que os professores reconheçam, entendam e valorizem a matemática oral, especialmente aqueles que lidam com alunos que têm oportunidade de trabalhar no setor informal da economia. Esta atividade matemática tem sólidas bases na compreensão do número e do sistema decimal, habilidades que devem ser utilizadas, e não desprezadas, pela escola (Carraher e outros, 1995. Pg. 65).


Para concluir, compreendendo que este diálogo ainda está inconcluso e que há muito que se debruçar sobre a questão para uma compreensão mais abrangente que torne o ensino da matemática mais agradável para quem é ensinado, é preciso apontar o ensino da matemática para uma visão além dos números, das fórmulas e dos cálculos. Morais, debatendo Infância, Cinema e Sociedade (1997) aborda a questão do consumo que permite classificar as pessoas a partir daquilo que elas consomem. Nesta sociedade em que se prioriza o consumo além das necessidades, onde os produtos são vistos por suas marcas em detrimento da qualidade, a matemática pode oferecer uma contribuição para a compreensão da realidade. Quantas pessoas se endividam comprando supérfluos atraídos pela facilidade de crédito de longo prazo? Nesta armadilha do marketing comercial acabam pagando dois produtos e ficando com apenas um. Quando acabam de pagar pelo produto adquirido, em alguns casos, ele já não existe mais.

Ora, compreender esta realidade e adequar os conceitos clássicos do ensino da matemática para um entendimento real dos problemas na vida das pessoas, pode ser significativo para diminuir o impacto do fracasso escolar, sobretudo diminuir a rejeição pela matéria, tornando o processo de ensino-aprendizagem da matemática dinâmico e concreto tanto para quem ensina quanto para quem é ensinado. Para D’Ambrósio (1996),

  • A educação para a cidadania, que é um dos grandes objetivos da educação de hoje, exige uma ‘apreciação’ do conhecimento moderno, impregnado de ciência e de tecnologia. Assim, o papel do professor de matemática é particularmente importante para ajudar o aluno nessa apreciação, assim como destacar alguns dos importantes princípios éticos a ela associados (grifo meu).

Então, adotar uma nova práxis educacional, esboçando um novo paradigma que substitua o ensino-aprendizagem que se baseia numa relação obsoleta, desestimulante, propondo uma relação educacional que se fundamenta no desenvolvimento criativo, que preserva a diversidade nessa relação planetária onde o respeito, a solidariedade e a cooperação sejam bases fundamentais para alicerçar o comportamento do professor/a com vistas a superação das dificuldades e da melhoria das condições de vida para todos.

(¹): Experiência vivida por Rildo Ferreira no CIEP 407 – Gilson Amado em Engenheiro Pedreira, distrito de Japeri no Rio de Janeiro, por ocasião de um trabalho de campo para o curso de Pedagogia.




...................................................................................
Referências Bibliográficas

MORAIS, Maria Cecília. Comentários: A criança e a Cidade in GARCIA, C. A. (Org.);
CASTRO, Lucia Rabello de (Org.); SOUZA, S. J. E. (Org.). Infância, cinema e
sociedade. 1. ed. Rio de Janeiro: Ravil/Coleção escola de professores, 1997.

D’AMBRÓSIO, Ubiratan. Educação Matemática: da teoria à prática. 12ª ed. Campinas/SP.
Papirus, 1996. – (Coleção Perspectivas em Educação Matemática).

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. [Saberes Necessários à Prática Educativa].
35a. ed. São Paulo. Paz e Terra, 1996 (coleção leitura).

CARRAHER, Terezinha Nunes. CARRAHER, David Willian. SCHLIEMANN, Analúcia
Dias. Na vida dez, na escola zero. 10a. ed. São Paulo. Cortez. 1995.

CENDALES, Lola. MARIÑO, Germán. Educação não-formal e educação popular. Para uma pedagogia do diálogo cultural [Educación no formal y educación popular]. São Paulo. Loyola, 2006. Tradução Thiago Gambi

Para comentar, clique aqui. Para ler comentários já postados, clique Aqui.